Terapia pelo ChatGPT: veja o que profissionais da área falam sobre o assunto
Psicólogo clínico avalia os benefícios e riscos do uso da inteligência artificial em processos de apoio emocional e saúde mental
O uso da inteligência artificial em contextos terapêuticos tem crescido no Brasil, com relatos de pessoas que recorrem ao ChatGPT em momentos de crise ou busca por orientação emocional.
Embora haja avanços tecnológicos relevantes, especialistas alertam para os limites desse tipo de ferramenta no campo da saúde mental.
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Pedro Paiva, psicólogo clínico, palestrante e professor da Escola de Filosofia Nova Acrópole, afirma que “toda ferramenta é útil e pode nos ajudar, inclusive nas questões ligadas à saúde em geral e especificamente na saúde mental”.
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Para ele, a tecnologia pode ser uma aliada, desde que esteja a serviço da humanidade.
“A tecnologia, como a ciência, é uma forma de expressão da nossa cultura ocidental e tem um valor inestimável. O problema é quando tiramos ela do lugar de serviço à humanidade e colocamos como fim em si mesma. A máquina não pode substituir o humano, mas pode auxiliá-lo.”
Segundo Pedro, o processo terapêutico vai além de técnicas ou respostas objetivas:
“Acredito que um processo terapêutico completo é muito mais do que a utilização de técnicas e ferramentas. Vejo que a conexão íntima, afetiva, profunda e real entre os ‘infinitos’ guardados em cada um de nós é o que realmente pode transformar o ser humano.”
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Terapia pelo ChatGPT: contato humano ainda é insubstituível
O psicólogo alerta que, ao buscar apenas interações com inteligência artificial, há um risco de perder o vínculo com o real.
“Considero o espaço terapêutico como uma câmara hermética, vedada, que permite fermentações, transformações que em um espaço público e aberto não são possíveis”, explica.
Segundo ele, o contato humano oferece uma conexão viva, essencial para o processo de transformação.
“O ser humano é um ser social, precisa dessa conexão com o outro, isso é vital. Informações técnicas, geradas por IA, são elementos novos, mas não com o mesmo poder que o contato humano, dotado de vida real, pode oferecer.”
Mesmo quando o terapeuta apenas reflete o que o paciente diz, o efeito é diferente. “O contato entre realidades, objetivas e subjetivas, permite o fluxo da vida sutil, e isso sempre abrirá novos caminhos e perspectivas.”
Terapia pelo ChatGPT: IA como apoio pontual, não como substituta
Pedro reconhece que a IA pode ter utilidade em situações específicas. “Há algum benefício se tratarmos de necessidades muito pontuais, com perguntas sobre como posso lidar com um sintoma ou outro.” No entanto, ele pondera que os sintomas muitas vezes revelam questões mais profundas.
“Por trás de todos os sintomas existe um indivíduo, uma necessidade mais profunda de expressão. Sem uma inteligência humana para buscar mais do que dados — mas um certo tipo de intuição que só surge dentro de uma relação genuinamente humana — esse indivíduo seguirá inalcançável.”
Ele ainda adverte: “Ainda que os sintomas cessem por um instante, a necessidade profunda permanecerá viva e encontrará outros caminhos para se expressar. O problema é que esses caminhos podem ser outros sintomas, mais complexos e até somáticos.”
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Terapia pelo ChatGPT: riscos da ausência de regulação e a necessidade de limites
No Brasil, ainda não há uma regulamentação específica sobre o uso de IA na saúde mental. Pedro avalia que essa ausência pode comprometer a segurança dos usuários. “Acho sim que a regulação é necessária, principalmente para preservar a privacidade e segurança dos dados dos usuários.”
Mas ele ressalta que a reflexão vai além das leis. “Acho que o mais importante é encontrarmos uma forma mais harmônica de relação com as tecnologias, todas elas, assim como com a ciência em geral.”
Segundo o psicólogo, “o papel da ciência e da tecnologia é servir à humanidade e à Natureza, respeitando esse lugar, não permitindo que o nosso protagonismo seja usurpado”.
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Terapia pelo ChatGPT: autonomia emocional e os perigos da dependência digital
Pedro também chama atenção para o risco de a IA reforçar padrões de dependência emocional. “A dependência emocional é um risco que todos corremos e certamente é algo que restringe nossa liberdade em seu sentido amplo.”
Ele argumenta que o interesse comercial das plataformas pode colidir com os objetivos terapêuticos. “O interesse das empresas por trás das ferramentas, principalmente das ‘gratuitas’, é justamente dominar nossa atenção, nosso interesse, para que fiquemos o máximo de tempo conectados.”
Por isso, ele acredita que não é saudável abrir espaço ir para a influência da IA no campo emocional. “Podemos regredir nessa busca por plena liberdade.”
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Em sua visão, é necessário manter o foco naquilo que nos humaniza: “A inteligência artificial pode servir ao ser humano, mas não podemos perder o contato com a vida em seu sentido mais profundo. Vida que se traduz por amor, segurança, união, contato real e qualificado.
Nada pode crescer e se desenvolver sem atenção e cuidado real. Uma simulação nunca será capaz de ocupar esse lugar que cabe ao ser humano em sua melhor expressão.”
Terapia pelo ChatGPT: pesquisas revelam crescimento do uso de IA para e emocional no Brasil
O uso de ferramentas de IA para apoio emocional tem crescido significativamente no Brasil. Uma pesquisa realizada pela Talk Inc revelou que 1 em cada 10 brasileiros recorre a chats de inteligência artificial, como o ChatGPT, para desabafar, buscar conselhos ou simplesmente conversar.
Os motivos incluem introspecção, escassez de amigos disponíveis e solidão, refletindo um aumento alarmante da solidão na sociedade contemporânea.
Além disso, um estudo global da Oracle apontou que 86% dos trabalhadores brasileiros estão abertos a ter um robô como terapeuta ou conselheiro.
A pesquisa também revelou que 64% dos brasileiros preferem falar com um robô sobre estresse e ansiedade em vez de seu gerente, destacando a crescente aceitação da IA como ferramenta de e emocional.
Terapia pelo ChatGPT: iniciativas brasileiras e regulamentação em andamento
No Brasil, algumas iniciativas têm buscado integrar a IA ao cuidado com a saúde mental. A empresa de telemedicina Vibe Saúde lançou, em agosto de 2024, a Vivi, uma “assistente de IA em saúde mental” que já conta com 16 mil usuários.
A IA avalia as mensagens enviadas pelo usuário e sugere um ciclo de cuidado de seis semanas baseado em técnicas da terapia cognitivo-comportamental.
Quanto à regulamentação, o Projeto de Lei 2338/2023, também conhecido como PL da Inteligência Artificial, visa estabelecer o marco regulatório para o desenvolvimento e uso de IA no Brasil.
O projeto busca proteger os direitos fundamentais, assegurar a implementação de sistemas seguros e confiáveis, e promover benefícios para a pessoa humana, o regime democrático e o progresso científico e tecnológico.
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